quinta-feira, 16 de maio de 2013

parte 3


        Foram horas de cavalgada e César realmente já não sabia mais onde os dois estavam. O sol parecia querer ir embora e dar lugar a luz da lua. Teriam que parar e levantar acampamento ali no meio da floresta. Foi o que fizeram. Procuraram um local onde pudessem se abrigar caso voltasse a chover, e encontraram algumas pedras formando um abrigo. Foi ali que César acendeu a fogueira com alguns galhos que encontrou pela volta. Depois de devidamente instalados, César comeu uma parte da refeição que sua mãe havia lhe preparado. Ele não sabia quantos dias ficaria fora, e pensou que a mãe, assim como ele, também não deveria saber, uma vez que aquela comida deveria durar no máximo até o dia seguinte. Acho que ela havia subestimado sua fome. Bebeu um pouco da água do cantil, na verdade não sentia sede, o trabalho duro foi todo feito pelo cavalo.
          - Toma, você precisa beber.
          “Na verdade eu não preciso de nada enquanto sou assim César.”
          - Assim? – não seria ele um cavalo de verdade pensava César.
          “Eu estou aqui assim para lhe ajudar, enquanto eu estiver assim, não preciso de nada, porque é a mágica que me torna o que eu sou agora.”
          - Mágica? Mas que história é essa amigo?
          “Eu não posso dizer César, você precisa descobrir durante a sua jornada, até levar a pedra de volta.”
          - Mas então você sabe onde devemos ir? Então essa história toda de pedra e do meu pai ser um homem especial é verdade? Minha mãe estava certa? Por que você não me conta? Eu preciso entender o que esta acontecendo, qual o propósito dessa viagem, de eu conseguir escutar os pensamentos de um cavalo!
          “Calma César. Primeiro, eu não sei onde devemos ir, só estou indo, como você mandou.”
          - Eu não mandei nada meu caro, você que me mandou subir nas suas costas.
          “Foi seu coração César, eu ouvi ele, ele que me disse por onde deveríamos seguir. Todo esse caminho por onde cavalgamos, talvez você não tenha percebido, mas foi você quem nos conduziu por ele, eu pude ouvir cada direção vindo do seu coração, e assim eu sabia por onde deveria seguir.” Houve uma pausa, César estava ainda incrédulo, e o cavalo parecia perceber isso, ele tinha paciência. “Quanto a historia da pedra, de seu pai, eu não sei bem, só sei o que foi dito para você. A única coisa que sei, é que devo ficar ao seu lado até onde eu puder agüentar, para ajudá-lo, como seu amigo”.

          A noite chegou e com ela a chuva, mas pelo menos por aquela noite os dois estariam protegidos. Dormiram com o calor da fogueira, que aos poucos foi se apagando, e a cada estalo das madeiras querendo virar brasa, o cavalo acordava. Pela manhã, a chuva persistia. Caia forte sem dar trégua.
          “César, teremos que esperar a chuva passar para continuarmos a jornada. Não seria nada saudável expô-lo a esta chuva, sendo que ainda precisará de muita saúde para continuar, ainda estamos no começo de tudo.”
          - Sim, tem razão. Ficaremos – e abriu o embrulho de folhas de milho que ainda continha uma parte da comida que sua mãe havia preparado. Comeu vagarosamente, saboreando cada pedaço, lembrando de todos os pratos que sua mãe já havia lhe preparado com amor. Teve vontade de chorar, mas não chorou, apenas encheu os olhos com lágrimas. O cavalo percebeu a angustia de César:
          “Acho que devemos conversar meu amigo, assim faremos o tempo passar mais rápido, enquanto esperamos a chuva cessar.”
          - Sobre o que quer falar? – disse César, engolindo os últimos pedaços da comida – Acabou!
          “Me conte da sua vida meu caro, tem algum amigo?”
          - Tenho sim um grande amigo, que se chama Gustavo.
          “E como ele é?” – César sentiu que o cavalo tentava distraí-lo de sua dor.
          - Ah, sei lá, ele é alto como eu, loiro e está acima do peso – deu uma risada ao lembrar-se da barriga de Gustavo, que costumava ser motivo de piadinhas dos garotos da vila.
          “Não é o que eu quero saber garoto, eu quero saber como ele é para você, que tipo de amigo ele é.”
          - Ah claro – pensou por um instante – Gustavo e eu somos amigos desde criancinhas. Nossas casas ficam bem próximas. Na verdade, eu me lembro bem da primeira vez que o vi. Acho que tínhamos uns sete anos, e chovia, assim como hoje. Eu voltava para casa e o vi sentado na frente da casa dele, estava encharcado da chuva e chorava. Quando perguntei o que houve, ele disse que seu cachorro havia fugido, o cachorro que era seu melhor amigo. Então dei a idéia de irmos procurá-lo. Passamos a tarde na busca do cachorro, até aqui nesta floresta entramos atrás dele. Quando ele finalmente apareceu, Gustavo me olhou e disse “a partir de hoje, meu melhor amigo é você!”. Depois disso nunca mais nos separamos. Estávamos juntos em todos os melhores e piores momentos. Ele sabe tudo sobre mim e eu sei tudo sobre ele, sei das coisas que ele mais gosta, e das que ele mais odeia. Sei como irritá-lo e sei como deixá-lo feliz. Sei que ele sente quando estou triste, e que sempre estará ao meu lado quando eu precisar.
          Havia lágrimas nos olhos do cavalo. Aquela amizade era realmente muito forte.
          - Onde quer que Gustavo esteja agora, sei que está pensando no meu bem estar, assim como estou agora pensando no dele. Esse sumiço das pessoas da vila, isso realmente está me preocupando. Preocupo-me com Gustavo, não sei onde ele está, e isso realmente está me deixando louco!
          “Não se preocupe meu amigo, tenho certeza de que ele deve estar bem, assim como os outros. E tenho certeza também, que como seu grande amigo, ele não gostaria que você desistisse agora, porque talvez disso dependa a volta de todos eles.”
          Os dois ficaram em silêncio, pensando na mesma história que César havia contado, pensando no mesmo momento, o momento em que os dois amigos encontraram o cachorro.

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